
Central do Timão
·27 Mei 2025
COAF aponta transações suspeitas no Corinthians, e Justiça nega habeas corpus a Augusto Melo

Central do Timão
·27 Mei 2025
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), órgão responsável por prevenir e combater a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo no Brasil, identificou transações da gestão de Augusto Melo, presidente afastado do Corinthians, com indícios de tentativa de “burlar a identificação da origem, destino e responsáveis”. Augusto foi afastado do cargo na última segunda-feira, 26, por decisão do Conselho Deliberativo do clube.
A informação foi divulgada pelo ge.globo, que teve acesso ao documento elaborado pelo órgão. No relatório, o COAF apontou: “Operações que, por sua habitualidade, valor e forma, configurem artifício para burla da identificação da origem, do destino, dos responsáveis ou dos destinatários finais”. Esse tipo de descrição faz parte de um texto padrão dos códigos de ocorrência do Banco Central, utilizados como parâmetro para a notificação aos órgãos competentes.
Foto: Rodrigo Coca/Ag. Corinthians
O documento foi obtido pela reportagem junto à análise financeira realizada pelo COAF sobre Alex Fernando André, conhecido como Alex Cassundé. Ele é apontado como um dos operadores do esquema que desviou recursos do contrato de patrocínio entre o Corinthians e a casa de apostas VaideBet. Cassundé foi indiciado no inquérito da Polícia Civil de São Paulo ao lado de Augusto Melo, Marcelo Mariano e Sérgio Moura.
O COAF também analisou uma das contas bancárias do Corinthians, mantida no Banco Santander, no período de 2 de janeiro a 19 de junho de 2024. Nesse intervalo, o clube movimentou R$ 808 milhões, tendo recebido R$ 404 milhões e repassado outros R$ 404 milhões. O alerta do COAF se deve ao alto volume de transações realizadas com empresas intermediárias de pagamento, o que dificulta a identificação da origem dos recursos. Entre os valores analisados, estão incluídos R$ 66 milhões recebidos pelo clube durante o período.
O órgão de fiscalização ainda identificou pagamentos realizados pelo clube a empresas consideradas suspeitas. Entre eles, estão R$ 294 mil destinados a uma empresa de segurança cujo sócio recebeu R$ 8.950 em auxílio emergencial durante a pandemia, e o repasse de R$ 1,4 milhão à empresa Rede Social Media Design, de Alex Cassundé, a título de comissão pela intermediação do contrato de patrocínio com a VaideBet.
Além disso, o COAF identificou que o Corinthians realizou 55 saques em espécie diretamente no caixa do banco, totalizando R$ 1.128.496,00 , uma média de R$ 20.518,11 por operação. O clube também efetuou 141 depósitos em dinheiro no caixa, que somaram R$ 374.452,00, com média de R$ 2.655,69 por transação.
Essas informações constam no documento atrelado à análise feita pelo órgão sobre a empresa de Alex Cassundé, apontado como operador de um esquema de lavagem de dinheiro envolvendo o Corinthians e a VaideBet, investigado pela Polícia Civil de São Paulo.
Habeas Corpus negado pela Justiça
Além do inquérito policial e do relatório do órgão de fiscalização financeira, Augusto Melo sofreu outra derrota na Justiça na noite da última segunda-feira. Horas antes da votação do pedido de impeachment no Conselho Deliberativo do Corinthians, o dirigente teve um habeas corpus negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
A juíza de Direito Márcia Mayumi Okoda Oshiro, da 2ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital, negou o pedido de habeas corpus impetrado em favor de Augusto Melo. A solicitação visava anular o indiciamento do presidente no inquérito policial que investiga o caso VaideBet.
A defesa de Augusto Melo tentava anular o indiciamento, alegando que a medida foi precipitada, carecia de fundamentação adequada e se baseava em provas frágeis. Segundo os advogados, o ato estaria causando prejuízos à imagem pública, à honra e à vida familiar do investigado.
Na decisão que rejeitou o pedido, a juíza destacou que o indiciamento é um ato de competência exclusiva da autoridade policial. Segundo ela, a intervenção do Judiciário nessa fase da investigação só se justifica em casos de evidente abuso ou ilegalidade — o que, de acordo com a magistrada, não foi comprovado pela defesa.
A magistrada também ressaltou que a defesa não apresentou documentação suficiente para sustentar a alegação de ilegalidade. Nem mesmo a cópia do indiciamento foi anexada ao processo, o que, segundo a juíza, impossibilitou uma análise mais precisa do pedido. Além disso, ela enfatizou que o habeas corpus é um instrumento jurídico voltado à proteção da liberdade de locomoção, o que não se aplica ao caso, já que não há qualquer ameaça de prisão ou restrição ao direito de ir e vir de Augusto Melo.
Com a negativa do habeas corpus, o processo seguirá seu curso regular. A juíza determinou que a autoridade policial responsável pelo indiciamento apresente, no prazo de até 48 horas, as informações sobre o caso. Em seguida, o Ministério Público será intimado para eventual manifestação. Após essas etapas, o processo retornará à magistrada para decisão definitiva sobre o mérito – confira o documento abaixo.
Estágio do inquérito policial
Após um ano de investigações, a Polícia Civil de São Paulo concluiu o inquérito do caso VaideBet com o indiciamento de quatro pessoas pelos crimes de associação criminosa, furto qualificado e lavagem de dinheiro. Entre os indiciados estão Augusto Melo, Sérgio Moura, ex-superintendente de marketing do Corinthians, Marcelo Mariano, ex-diretor administrativo, e Alex Cassundé, apontado pelo clube como intermediário no acordo com a casa de apostas.
A investigação, conduzida pelo delegado Tiago Fernando Correia, do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC), conseguiu rastrear o caminho do montante pago pelo Corinthians à suposta intermediária do contrato. Segundo a polícia, os valores foram desviados por meio de uma complexa rede de transferências bancárias – descrita no inquérito como um “percurso maquiavélico” – que terminou na empresa UJ Football Talent Intermediação. Essa empresa foi apontada por Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, delator do Primeiro Comando da Capital (PCC), como parte das operações do grupo criminoso no mundo do futebol.
Agora, o caso será encaminhado ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que analisará as conclusões do delegado e todas as evidências reunidas pela investigação desde maio do ano passado. Vale lembrar que um promotor do MP acompanhou de perto o trabalho da Polícia Civil ao longo do inquérito, participando inclusive das oitivas – uma prática comum, que busca dar mais agilidade e eficácia aos procedimentos investigativos.
O MP-SP tem total autonomia para decidir os próximos passos em relação à investigação conduzida pela Polícia Civil. A promotoria pode acatar integral ou parcialmente as recomendações de indiciamento, modificar alguma das acusações, incluindo crimes não apontados pela polícia, ou até mesmo rejeitar as conclusões do inquérito e solicitar seu arquivamento.
Nesta nova etapa, o Ministério Público pode solicitar novas diligências ou depoimentos, caso considere necessário para esclarecer os fatos. No entanto, também é possível que a decisão seja tomada com base apenas na análise dos autos do inquérito. Com isso, existe a possibilidade de que o presidente Augusto Melo nem chegue a ser ouvido pelos promotores.
Se o MP-SP decidir pela continuidade do inquérito, seja mantendo as acusações da polícia ou alterando-as, ele apresentará a denúncia dos envolvidos à Justiça, que deverá analisá-la e decidir sobre seu recebimento. Caso a denúncia seja aceita, será instaurado um processo na primeira instância, tornando os acusados, oficialmente, réus.
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