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Central do Timão

·23 de maio de 2025

Delegado cita “intermediação simulada” e “ação criminosa” de indiciados para desviar dinheiro de comissão

Imagem do artigo:Delegado cita “intermediação simulada” e “ação criminosa” de indiciados para desviar dinheiro de comissão
  1. Por Daniel Keppler / Redação da Central do Timão

Nesta quinta-feira, 22, o delegado Tiago Fernando Correia, do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC) da Polícia Civil de São Paulo, concluiu o inquérito sobre o caso VaideBet, recomendando o indiciamento, pelos crimes de associação criminosa, furto qualificado e lavagem de dinheiro, Augusto Melo (presidente do Corinthians), Sérgio Moura (ex-superintendente de marketing), Marcelo Mariano (ex-diretor administrativo) e Alex Cassundé (indicado pelo clube como intermediário do acordo com a casa de apostas).

A Central do Timão teve acesso ao relatório com a conclusão do delegado sobre as investigações. O documento, com 116 páginas, descreve em detalhes o passo-a-passo seguido pela polícia para justificar os indiciamentos, afirmando que a intermediação defendida pelos indiciados, na verdade, não aconteceu, servindo de pretexto para desviar recursos do Corinthians. Confira a seguir os pontos principais do relatório:


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Montagem/Reprodução

Encontro que não aconteceu

A polícia afirma, no relatório, que a intermediação da empresa Rede Social Media Design, de Alex Cassundé, jamais aconteceu, tendo sido forjada pelos envolvidos no acordo. Em seu depoimento, Cassundé deu a entender às autoridades que jamais teve acesso a detalhes da negociação entre Corinthians e VaideBet, tendo sido “escolhido” para figurar como intermediário do contrato, posteriormente.

Em suas oitivas, os quatro indiciados divergiram completamente sobre o contexto da suposta intermediação, em todos os seus elementos. Ou seja, Alex Cassundé, Sérgio Moura, Marcelo Mariano e Augusto Melo forneceram versões diferentes para todos os questionamentos das autoridades, sobre a participação da Rede Social Media no acordo com a bet.

Como exemplo, vale destacar o relato sobre uma suposta visita de Cassundé ao Parque São Jorge, em dezembro de 2023. Cassundé disse que foi ao clube encontrar Marcelinho, por orientação de Sérgio Moura, que estaria ausente no dia. Já Marcelinho alegou que Cassundé foi levado a ele por Moura, pessoalmente. Por sua vez, Moura sustentou que Cassundé pediu para ir ao clube, onde os três se encontraram. E embora nenhum deles tenha citado Augusto Melo, o presidente corinthiano afirmou que foi apresentado a Cassundé no mesmo dia, por meio de Marcelinho.

Na sequência do documento, porém, todas estas versões são desmentidas pela polícia que, por meio da quebra do sigilo telemático do telefone de Alex Cassundé, comprovou que o mesmo não apenas não esteve no Parque São Jorge na semana citada pelos investigados em depoimento, como sequer se aproximou da região entre 9 e 31 de dezembro de 2023.

Mais divergências

As mesmas divergências foram apontadas em outras situações envolvendo a suposta intermediação. Além disso, o empresário não conseguiu comprovar à polícia diversas afirmações, como por exemplo o uso do ChatGPT para “conseguir contatos de patrocínio”. Além disso, Cassundé falhou em provar seu contato com um certo “André”, supostamente ligado à VaideBet, cujo telefone ele teria encontrado na internet.

As duas pessoas da casa de apostas com este nome foram ouvidas pela polícia, negando conhecer Cassundé. E Cassundé, por sua vez, não conseguiu comprovar o suposto contato telefônico que realizou, já que formatou seu WhatsApp no fim de maio de 2024, logo após a denúncia do repasse à empresa laranja estourar na mídia. Também não conseguiu comprovar supostos contatos por e-mail, pois teria excluído as mensagens e “destruído os equipamentos” que as continham, conforme depoimento.

O debate sobre a comissão também foi alvo de divergências: enquanto Cassundé disse que não pediu valores a Sérgio Moura pela intermediação, Moura afirma que o montante foi sim exigido e negociado – mas as datas desta suposta conversa são diferentes nas oitivas. A mesma situação acontece em relação à assinatura do contrato em si, supostamente exigida por e-mail a Cassundé. No entanto, tal e-mail jamais foi apresentado às autoridades, que concluíram que, na verdade, o e-mail não existe.

Falta de cooperação do Corinthians

Em busca de mais respostas sobre o papel de Alex Cassundé e da Rede Social Media Design no caso, as autoridades buscaram então o Corinthians para que pudesse se manifestar. Um ofício foi enviado ao clube com questionamentos no dia 13 de fevereiro deste ano, para ser respondido em até cinco dias – o que o clube não fez. O clube, então, foi cobrado com um novo ofício no dia 11 de março, mas novamente ignorou a polícia, sequer solicitando um prazo maior para resposta.

Apenas após o envio de um terceiro ofício, no dia 20 de março, cujo texto cita o Conselho de Orientação (CORI) observando seu papel de órgão fiscalizador do clube, é que a diretoria respondeu a polícia, afirmando que, inicialmente, apenas Sérgio Moura e Marcelo Mariano mantiveram contato com Alex Cassundé – três semanas depois, esta afirmação seria desmentida pelo próprio Augusto Melo em depoimento.

Na resposta, o Corinthians ainda apontou a plataforma Docusign como sendo a ferramenta usada para coletar as assinaturas dos envolvidos no contrato – sem conseguir apontar, no entanto, os e-mails dos outros signatários. É neste ponto que o relatório levanta a hipótese de que a assinatura de Alex Cassundé tenha sido fraudada no contrato com a VaideBet.

Pagamento das comissões

Em outro momento do relatório, a polícia observa que apenas após a assinatura do contrato a Rede Social Media solicita à Junta Comercial de São Paulo a CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) relativa à intermediações financeiras. O pedido ocorreu dia 16 de janeiro de 2024, seis dias após ser emitida a nota fiscal relativa ao pagamento da primeira parcela de sua comissão, no valor de R$ 700 mil.

À polícia, Cassundé tentou sustentar que tal valor teria sido recebido apenas em março, na verdade, o que se provou falso. Afinal de contas, neste mês, especificamente no dia 1º, foi feito o pagamento da segunda parcela de R$ 700 mil, quando se totalizaram os R$ 1,4 milhões pagos pelo Corinthians à empresa pela intermediação que a investigação aponta jamais ter existido.

Neste dia 1º de março, inclusive, o empresário passou a tarde no Parque São Jorge, segundo os registros telefônicos – fato omitido pelo mesmo em seu depoimento, e também não citado por nenhum outro investigado, o que chamou atenção das autoridades.

No entanto, o pagamento destas notas ainda não havia sido feito, e o contexto da cobrança destes valores foi, novamente, alvo de divergências entre Cassundé, Marcelinho e Sérgio. Um e-mail de Cassundé a Sérgio foi citado, mas nenhum dos dois apresentou a cópia do mesmo à polícia. Nem mesmo as datas de recebimento dos valores (18 e 21 de março) foram lembradas corretamente pelo falso intermediário.

A lavagem do dinheiro

O documento, então, detalha como o valor milionário passou do Corinthians à Rede Social Media e desta para a Neoway Soluções Integradas, empresa fantasma cuja dona no papel, Edna Oliveira, desconhecia a existência. Alex Cassundé afirma que transferiu R$ 1,06 milhão à Neoway após ser enganado por uma pessoa chamada Mauricio Manfra, de quem teria levado um golpe após adquirir um sistema de telemedicina pet.

Ocorre que, após investigar, as autoridades descobriram que o telefone atribuído a esta pessoa foi desativado em 31 de maio de 2024 – o mesmo dia em que Cassundé formatou seu WhatsApp. Pior: posteriormente, a polícia apurou que Maurício Manfra, na verdade, havia falecido em 26 de abril de 2024, vítima de uma doença degenerativa que o manteve internado em um hospital nos últimos meses de vida.

Além disso, a polícia também observou no relatório o fato de que, apesar de alegar ter “perdido” o valor milionário em um golpe, Alex Cassundé jamais registrou sequer um boletim de ocorrência para denunciar o caso. O valor real da transferência também não corresponde ao citado pelo empresário, já que a Neoway, na verdade, recebeu da Rede Social Media R$ 1,042 milhão, em dois depósitos.

Escondendo o intermediário

Ao investigar o modo como a Rede Social Media apareceu no contrato, chamou a atenção das autoridades a demora com que o Corinthians incluiu a empresa no documento. Embora o jurídico alvinegro já tivesse os dados desde 29 de dezembro de 2023, a primeira minuta (versão) do documento sequer tinha o campo de intermediário – este só surgiu na segunda minuta. Por sua vez, a inclusão dos dados em si ocorreu apenas na terceira versão, em 3 de janeiro de 2024.

Para a polícia, este e os elementos anteriores, juntos, demonstram que a intermediação de Alex Cassundé jamais aconteceu, e a gestão do Corinthians buscou, de todas as formas, esconder o empresário dos radares da negociação – o relatório exemplifica essa afirmação expondo que o mesmo não esteve no anúncio do patrocínio, no Parque São Jorge, embora tenha comparecido, por exemplo, à posse de Augusto Melo.

Os reais intermediários

O documento então cita o nome de Antônio Pereira dos Santos, o “Toninho Duettos”, personagem que surgiu no caso VaideBet após ser revelado em entrevista à Gazeta Esportiva, onde se declarava o real intermediário do acordo entre Corinthians e VaideBet. A essa altura, a polícia já tinha o seu nome em mãos, pois o mesmo havia sido citado pela VaideBet em depoimento de José André da Rocha Neto, dono da casa de apostas.

José André afirmou às autoridades que, interessado em patrocinar o Corinthians, procurou Toninho, pois sabia que este tinha “contatos” no clube. E em seguida, viajou a São Paulo, para se encontrar com o empresário e membros do Alvinegro: Augusto Melo e Marcelo Mariano. A mesma versão foi dita, em detalhes, por Toninho na entrevista à Gazeta.

A reunião onde o negócio foi fechado verbalmente aconteceu em 27 de dezembro de 2023 no Hotel Tívoli. No entanto, já no final do encontro, Toninho foi avisado por Marcelo Mariano que outra pessoa constaria no contrato como intermediária e que a sua comissão pelo acordo seria paga de outra forma. A polícia define o movimento como um golpe do ex-diretor administrativo no empresário.

O contato de Toninho no clube era Washington Araújo, coordenador de redes do Corinthians. A “ponte” entre ambos foi um funcionário de Toninho chamado Sandro, que conheceu o dirigente alvinegro antes de o mesmo ingressar na campanha de Augusto Melo à presidência do Corinthians. Eles apresentaram às autoridades prints de conversas e fotos, onde comprovaram estes vínculos.

Sandro chega a publicar, em suas redes, um story onde exibe uma camisa do Corinthians com o logo da VaideBet, exaltando o acordo e marcando o perfil de Augusto Melo. Após a reunião no Hotel Tívoli, ele também grava um vídeo com o presidente alvinegro – um frame do conteúdo é exibido no relatório. Meses depois, em depoimento, Augusto Melo garantiu à polícia nunca ter conhecido Sandro.

Os indiciamentos

O relatório então passa a descrever os indiciamentos, baseado nas evidências coletadas durante a longa investigação. No documento, o delegado aponta a intermediação de Alex Cassundé como uma “simulação” planejada e viabilizada por uma “atuação orquestrada e criminosa” de Augusto Melo, Marcelo Mariano e Sérgio Moura, para afastarem do negócio os reais intermediários e manterem o controle sobre o dinheiro relativo à comissão do contrato.

No texto, é sustentada a tese de que todos os envolvidos agiram com dolo no esquema e que, considerando que o fato de a Rede Social Media ter recebido R$ 1,4 milhão do Corinthians por uma intermediação inexistente implica em afirmar que o clube foi vítima de furto qualificado (artigo 155, parágrafo 4º do Código Penal). A UJ Football Talent, destinatária final de R$ 1,074 milhão deste total, é citada neste trecho para reforçar o argumento das autoridades.

A polícia também diz que o esquema criminoso se aproveitou de um abuso de confiança de Augusto Melo, Marcelo Mariano e Sérgio Moura para com os corinthianos que elegeram a chapa para dirigir o Corinthians. Tal abuso de confiança dos então dirigentes alvinegros faz recair, para a polícia, a acusação de fraude sobre Alex Cassundé.

O documento afirma, ainda, que a reunião do grupo para a celebração do esquema faz impor, por si só, o crime de associação criminosa (artigo 288 do Código Penal), e pondera que o grupo estava ciente de que, não sendo Cassundé o destinatário do dinheiro desviado do Corinthians, um esquema de transferências seria executado para mascarar o real “dono” dos recursos. Por saberem disso, lhes recairia também o crime de lavagem de dinheiro (artigo 1º da Lei 9613/98).

Por fim, o relatório deixa em aberto a situação do ex-diretor jurídico Yun Ki Lee, cujo advogado solicitou habilitação nos autos e, tendo em vista que o pedido ainda não foi apreciado, as conclusões sobre o mesmo serão feitas posteriormente. O delegado aponta, porém, que considera que o ex-dirigente “deixou de se atentar a detalhes cruciais da negociação”, especialmente ao se levar em conta sua experiência profissional e jurídica.

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