Calciopédia
·17 de abril de 2020
Calciopédia
·17 de abril de 2020
Nem sempre os mais habilidosos desfilam sua classe pelos gigantes do futebol ou são incensados como verdadeiras divindades no panteão do esporte. Mas, ao menos por torcidas de clubes específicos, esses jogadores são reconhecidos como merecem. Esse é o caso do meia-atacante francês Johan Micoud, que deu títulos importantes para o Bordeaux, no seu país, e o Werder Bremen, na Alemanha, e que também levantou uma taça pelo Parma, em sua breve passagem pela Itália.
Micoud sempre esteve ao redor das estrelas ou no rastro delas. Nascido na badalada Cannes, famosa por seu festival de cinema, Johan passou à margem dos principais times da Riviera Francesa. Nada de Marseille, Monaco ou Nice: o meio-campista ofensivo começou na base do Cannes, tal qual Zinédine Zidane, Patrick Vieira e Sébastien Frey, e se profissionalizou em 1992, aos 19 anos. O seu dever seria substituir Zidane, que deixou os dragões após o rebaixamento e foi para o Bordeaux naquele ano.
O garoto estreou na segundona francesa e contribuiu para que o Cannes voltasse para a elite, deixando o rival Nice para trás. No ano de debute na primeirona, foi um dos principais condutores do time alvirrubro numa surpreendente campanha, que resultou em vaga na Copa Uefa. No papel de astro da companhia, Micoud ainda ajudou os dragões a realizarem duas campanhas valorosas, concluídas em colocações de meio de tabela. Em 1996, então, o meia-atacante trocou de clube depois de 131 aparições e 18 gols marcados. O destino era o Bordeaux: o dever era, novamente, substituir Zidane, que rumara à Juventus.
Se Micoud foi considerado ideal como alternativa a Zizou em duas ocasiões, motivo havia. E essas razões passavam por sua capacidade de ser decisivo da intermediária em diante. Le Chef, como era chamado, podia deixar companheiros na cara do gol com poucos toques ou decidir partidas com sua finalização apurada de média e longa distância – principalmente na bola parada. Johan ainda se valia de seu 1,85m para aparecer como elemento surpresa e, de vez em quando, estufar as redes com cabeçadas.
Quando contratou Johan, o Bordeaux vinha de algumas classificações à Copa Uefa, mas não retomava o seu auge, obtido com três títulos franceses na década de 1980. O tradicional time girondino garantiu vagas na segunda mais importante competição continental em três das quatro temporadas em que Micoud defendeu o branco e azul marinho bordalês. Em uma delas, foi além: jogou a Champions League 1999-2000 porque faturou o caneco nacional.
Micoud teve excelentes números pelo Bordeaux e contribuiu para que jogadores como Jean-Pierre Papin, Lilian Laslandes e Sylvain Wiltord marcassem muitos gols. Le Chef, por sua vez, também era prolífico. Ele teve seu auge pelos marine et blanc em 1998-99, quando anotou nove gols na campanha do título local e mais três na boa participação na Copa Uefa. A trajetória francesa foi encerrada nas quartas de final, ante o Parma, que se sagraria campeão: depois que Jo marcou na vitória por 2 a 1 na França, os crociati devolveram um sonoro 6 a 0 e avançaram.
Em 1999, o meia-atacante estreou pela seleção francesa – onde não teve tantas oportunidades porque tinha de duelar com Zidane, um dos maiores craques de todos os tempos. As atuações consistentes pelo Bordeaux, tanto no campeonato local quanto na Champions League, porém, o mantiveram no grupo dos Bleus e fizeram com que ele fosse convocado à Eurocopa. Micoud atuou apenas na derrota por 3 a 2 para a Holanda, na fase de grupos do torneio, mas pode acrescentar o título europeu ao currículo.
Depois da conquista da Euro, Johan também ganhou a oportunidade de disputar um campeonato mais expressivo do que o francês. E dessa vez não substituiria Zidane, mas o encararia. Micoud chamara a atenção do Parma desde o confronto na Copa Uefa e se consolidou na lista de desejos do clube emiliano com as atuações pela França e, sobretudo, pelo Bordeaux – na Liga dos Campeões, o trequartista incomum, de expressiva estatura, também impressionara contra a Fiorentina. Em 2000, o negócio se concretizou, por cerca de 7,5 milhões de euros.
Beirando os 27 anos, o meia-atacante francês chegou a um time que tinha os compatriotas Lilian Thuram, Alain Boghossian e Sabri Lamouchi com a intenção de brigar por títulos e, eventualmente, disputar a Champions League outra vez. Afinal, o Parma era bem estruturado e ainda tinha o comando de Alberto Malesani, o mesmo técnico que havia vencido a Copa Uefa. Contudo, as saídas de Hernán Crespo e Mario Stanic desarrumaram a equipe, que começou a temporada 2000-01 com altos e baixos. Arrigo Sacchi foi contratado para o lugar de Malesani, mas só dirigiu a equipe por três rodadas: estressado, deu lugar a Renzo Ulivieri, que finalizou a campanha em alta. Os crociati ficaram com a quarta posição na Serie A e vaga na UCL, além do vice da Coppa Italia.
Na confusa temporada do Parma, Micoud foi uma das poucas constantes. Devido ao troca-troca de técnicos, as peças utilizadas também variaram muito, ao sabor do extenso e qualificado elenco parmense. Na Serie A, por exemplo, apenas Gianluigi Buffon, Fabio Cannavaro, Lamouchi e Thuram superaram os 2 mil minutos. Jo, quinto mais utilizado, fez 1993, distribuídos em 29 das 34 rodadas. Le Chef mostrou serviço logo nas primeiras aparições, com dois belos gols (contra Perugia e Udinese) nas seis rodadas iniciais. O francês manteve a toada ao longo de 2000-01, chegou a deixar sua marca com uma cavadinha no histórico 6 a 1 das quartas de final Coppa contra a Inter e encerrou o ano com sete tentos em 39 aparições.
Por causa da ambientação à Itália, se imaginava que a segunda temporada de Micoud no Parma pudesse ser ainda melhor. Contudo, os crociati já se desarranjaram no verão. Buffon e Thuram foram para a Juventus, Amoroso acertou com o Borussia Dortmund e Sérgio Conceição, com a Inter. Para seus lugares, foram contratados Frey, Martin Djetou, Hakan Sükür e Hidetoshi Nakata, respectivamente – somente o goleiro francês e, em parte, o japonês, renderam bem. Para piorar, Le Chef sofreu com problemas físicos e uma lesão que o deixaram de molho por quase toda a primeira parte da campanha. Não entrou em campo, por exemplo, na fase preliminar da Champions League, quando o Parma foi eliminado pelo Lille e “rebaixado” para a Copa Uefa.
Naquela temporada, Micoud só viria a entrar em campo em novembro de 2001, quando Ulivieri já havia sido demitido e dado lugar a Daniel Passarella – que também durou pouco e, menos de dois meses depois, viu Pietro Carmignani tomar seu posto. Nas sete partidas que fez, anotou dois gols: na primeira como titular, contra o Messina, pela Coppa Italia, e quando voltou a jogar do início pela Serie A, diante da Atalanta. Isso só mostrava o poder de decisão do francês e a vontade de recuperar o tempo perdido. No Italianão, porém, o Parma não conseguiu reconquistar terreno e terminou o campeonato na 10ª posição.
Le Chef até tentou ajudar e, atuando mais como o segundo atacante de um 4-4-1-1, marcou cinco gols nas 18 partidas que fez pela Serie A. Se não adiantaram tentos como o guardado no clássico contra o Piacenza e contra o Venezia, em seu último jogo pela competição, ao menos o trequartista teve a chance de comemorar seu único título na Itália. Micoud foi titular nos três compromissos finais do Parma na Coppa Italia e esteve em campo tanto na ida quanto na volta da decisão ante a Juventus. Na peleja do Ennio Tardini, jogou bem e chegou a ter um gol anulado.
No verão de 2002, uma série de motivos fizeram com que Johan trocasse o Parma pelo Werder Bremen: a enésima mudança de comando no clube e a crise financeira da Parmalat, que se agravava, acabaram se somando à boa oferta dos alemães. Sendo assim, depois de 65 jogos e 13 gols pelos gialloblù, Micoud alçaria novos voos. Antes disso, porém, ele disputou a Copa do Mundo pela França: dessa vez, por conta da lesão de Zidane, atuaria em duas partidas na vexatória participação gaulesa.
A mudança para Bremen fez muito bem a Le Chef, que viveria seu auge no Weserstadion. Em quatro anos com a camisa 10 do Werder, Micoud simplesmente foi eleito para a seleção da Bundesliga em três oportunidades (2002-03, 2003-04 e 2005-06) – mesma quantidade de vezes que classificou a equipe para a Liga dos Campeões. Na Alemanha, Johan virou ídolo, ganhou homenagem da torcida com adaptação de “Hey Jude”, dos Beatles, e conquistou títulos.
Micoud teve colegas importantes na história do Werder Bremen, como Tim Borowski, Frank Baumann, Fabian Ernst, Ivan Klasnic, Miroslav Klose e Aílton. Com suas assistências, o francês consagrou os atacantes do time de Thomas Schaaf: tanto o brasileiro quanto Miro foram artilheiros da Bundesliga. O melhor momento de Johan ocorreu em 2003-04, quando o time faturou a dobradinha nacional (campeonato e copa), com 15 gols seus em 42 jogos. Em 2005-06, o francês também teve atuações de gala e foi o líder em assistências da Alemanha e da UCL. No torneio continental, o Werder Bremen repetiu o desempenho de 2004-05 e caiu nas oitavas.
Embora estivesse jogando o “fino”, Micoud foi esquecido pelos técnicos da seleção francesa no período pós-Copa do Mundo de 2002. Jacques Santini o chamou para um amistoso em 2004 e foi só – Raymond Domenech nem lhe deu oportunidades. Ainda assim, Jo era idolatrado pelos torcedores do Bordeaux, que vibraram pelo seu retorno, em 2006. Em sua segunda passagem pelos girondinos, o meia-atacante foi titular absoluto com o técnico Ricardo Gomes e ganhou uma Copa da Liga Francesa. Em 2007-08, ainda que menos utilizado por Laurent Blanc, terminou a temporada com oito gols e contribuiu para que a equipe se classificasse para a Champions League.
Micoud acabou se aposentando em 2008, pouco após completar 35 anos. Atritos com Blanc, que pretendia rejuvenescer o elenco e não contava mais com Johan, fizeram com que ele deixasse o Bordeaux e optasse por não buscar outras equipes. Ao deixar os gramados, Micoud até se tornou comentarista esportivo na imprensa francesa, mas preferiu levar a discrição e seu refinamento para outras áreas. O ex-jogador criou um selo de produção musical, o Virage Tracks, e também virou sócio do ex-lateral Matthieu Chalmé numa vinícola. Sofisticado no futebol, requintado na vida: este é Le Chef.
Johan Cédric Micoud Nascimento: 24 de julho de 1973, em Cannes, França Posição: meia-atacante Clubes: Cannes (1992-96), Bordeaux (1996-2000 e 2006-08), Parma (2000-02) e Werder Bremen (2002-06) Títulos: Campeonato Francês (1999), Eurocopa (2000), Coppa Italia (2002), Bundesliga (2004), Copa da Alemanha (2004) e Copa da Liga Francesa (2007) Seleção francesa: 17 jogos e um gol
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