Trivela
·23 de julho de 2022
Trivela
·23 de julho de 2022
A França, até este sábado (23), jamais havia alcançado a fase semifinal da Eurocopa 2022. Diante da Holanda, atual defensora do título, a seleção de Corinne Diacre superou sua própria maldição e classificou-se para o penúltimo jogo da competição, contra a Alemanha. O placar de 1 a 0 foi merecido, mas conquistado apenas na prorrogação, em Rotherham.
O favoritismo era todo das francesas, apesar do histórico recente da Holanda no cenário internacional. Desde a saída de Sarina Wiegman do comando da equipe, as Leoas encontraram algumas dificuldades para desenvolver o potencial esperado. Mark Parsons, escolhido para a sequência do trabalho, falhou em extrair o melhor de seu elenco e, depois de uma primeira fase abaixo da crítica, entrou com um time muito passivo diante da França. O técnico mexeu mal e muito tarde, provavelmente demorando a ler a dinâmica que se apresentava na partida.
Por esse motivo, duas atletas de defesa da Holanda se destacaram: a novata Daphne van Domselaar, que cumpriu com louvor a dificílima tarefa de substituir Sari van Veenendaal; e a sempre regular e implacável Stephanie van der Gragt. As duas impediram uma goleada francesa com ótimo tempo de bola e verdadeiras defesas. A zagueira van der Gragt fez dois bloqueios em cima da linha, quando a colega não estava na disputa. Já van Domselaar, teve muita maturidade para saltar na bola quando exigida: fez pelo menos oito defesas, entre os 11 chutes das Bleues no gol.
Diacre, sabendo do potencial ofensivo de seu elenco, preferiu uma proposta mais ofensiva e fluída, tento Kadidiatou Diani como sua principal atacante. A ausência de Marie-Antoinette Katoto pesou demais para aquela que se apresentava como favorita ao título, ao lado da Inglaterra. Sem Katoto, Diani teve de carregar um peso enorme e, pelo menos no jogo de hoje, deixou a desejar. As principais armas francesas eram a onipresente Sakina Karchaoui e Delphine Cascarino. Outra protagonista, Grace Geyoro, perdeu gols demais, sobretudo uma chance no fim da segunda etapa, que poderia ter alterado o destino do jogo.
Não só de van Domselaar viveu o fã de grandes goleiras nesta tarde. Pauline Peyraud-Magnin entregou uma atuação sem alarde e muita segurança, não parecendo em momento algum que seria vazada. E esse trabalho fica mais fácil quando você tem uma Wendie Renard à sua frente, bloqueando as principais chances. Sem sofrer atrás, a França teve paciência para armar seu jogo e tentar castigar as holandesas. Só não fez isso por uma tarde mais do que inspirada da arqueira das Leoas.
Ofensivamente, a Holanda pouco fez em campo. As melhores chances saíram dos pés de uma Vivianne Miedema prejudicada pela ausência nos treinos e últimas duas partidas. Cansada e sem tempo adequado nas jogadas, a goleadora holandesa foi presa fácil para Renard e tentou distribuir mais o jogo quando percebeu que não teria a última bola para o arremate. Atrás de Miedema, Daniëlle van de Donk esteve sumida, Jackie Groenen muito errática e uma bastante participativa Sherida Spitse, cã de guarda da defesa.
A opção por entrar com Victoria Pelova na vaga deixada por Lieke Martens não surtiu efeito no jogo de quartas de final. Bem marcada, Pelova não conseguiu ter campo para tirar coelhos de sua cartola. Já Lineth van Beerensteyn, pouco tocou na bola antes de sair no intervalo, trocada por Jill Roord, que até então era a melhor jogadora do time no torneio. Essa inércia custou caro: as holandesas só levaram perigo no fim da partida e em alguns momentos da prorrogação, mas o jogo foi totalmente desenhado para que a França saísse vitoriosa. Outras mexidas possíveis na prorrogação só aconteceram nos últimos 15 minutos: Damaris Egurrola também não teve tempo para muita coisa e Esmee Brugts causou impacto na sua ala do campo, deixando o gosto de que poderia ter entrado mais cedo.
Detalhes que indicam uma decadente Holanda no torneio. Facilmente anulada em suas principais artimanhas, viu a França ter mais volume e inúmeras chances. Não se engane: foram 26 finalizações da equipe de Diacre, que merecia sim ter saído de campo com uma goleada ainda no tempo normal. O que apenas serve para engrandecer a atuação de van Domselaar e van der Gragt. No último minuto, na principal arma francesa, a bola aérea, Renard subiu mais que todo mundo (como se precisasse) e testou firme no ângulo, mas van Domselaar salvou e provou que as grandes ligas podem lhe fazer propostas nas próximas semanas, já que a Vrouwen Eredivisie ficou pequena demais para o seu jogo.
Se van der Gragt teve uma atuação nota 10, não se pode dizer o mesmo de Dominique Jansen. No início da primeira etapa da prorrogação, a zagueira se estabanou e cometeu um pênalti desesperado em Diani, decidindo a partida. Foi o único lance em que a retaguarda laranja ficou exposta. Na cobrança, Eve Perisset foi muito competente e venceu a arqueira rival com um chute baixo no canto esquerdo. A bola ainda tocou nas mãos de van Domselaar, mas morreu nas redes.
A França continuou em cima para tentar decidir o jogo, desperdiçando chances boas de gol com Ouleymata Sarr, que entrou em outro tom, abaixo do das colegas. E não foi preciso muito mais que isso. Competente e sem oferecer espaço para que a Holanda finalizasse, a seleção francesa teve força mental e foco para manter o placar como estava.
A partida foi muito complicada e as circunstâncias favoreceram o bom trabalho de Diacre: sem Miedema em condições de jogo, a grande ameaça do outro lado estava automaticamente neutralizada. Não havia outra jogadora na Holanda capaz de mudar o confronto como a camisa 9 e isso acabou sendo a grande barreira para o que seria uma milagrosa vitória laranja. Pelo que fez em toda a Euro, a Holanda de fato não conseguiria ir mais longe do que isso.
Com a vitória francesa nos pés de Perisset, a chave das semifinais foi definida: na terça-feira, a Inglaterra encara a Suécia, enquanto na quarta, a França encara a Alemanha. Não há mais margem para erro e o equilíbrio agora é absoluto. Evidente que inglesas e alemãs ostentam um leve favoritismo dentro do que vimos até aqui na Euro, mas não podemos descartar uma decisão diferente do óbvio. A barra da competição está subindo e o nível também, para quem aprecia um futebol bem jogado.