OneFootball
·11 de abril de 2025
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·11 de abril de 2025
Por Alex Mott, jornalista da edição inglesa do OneFootball
É um estádio que rivaliza com qualquer um da Europa, com uma atmosfera que beira o nível insano do futebol sul-americano.
Se Riade é o centro governamental e financeiro da Arábia Saudita, então, pela breve experiência que tive no país, Jedá parece ser a capital do futebol.
Viajei até a costa oeste da península para assistir Al-Ahli enfrentar o líder da Saudi Pro League, Al-Ittihad, no que é conhecido localmente como o “Clássico do Mar”.
Com ambos os clubes fundados duas a três décadas antes de seus rivais na capital, este é o jogo mais antigo e prestigioso do Reino — e um que os torcedores levam muito a sério.
"Acho que esse é o maior clássico da Arábia Saudita", conta Fawad, torcedor do Al-Ahli, no agitado parque de torcedores antes da partida. "Somos os dois melhores times com as melhores torcidas. Quando você ver o estádio depois, vai entender por que esse é um dos maiores clássicos do mundo", completou.
É uma afirmação ousada, mas Salem, torcedor do Al-Ittihad vestido de amarelo e preto, concorda: "Esse é um jogo especial. Para mim, o mais especial de toda a Arábia Saudita. É uma partida inesquecível".
A caminho da entrada de imprensa, falo com outro torcedor do Ahli, Ali Hamed, usando uma camisa com “Toney 99” nas costas. Pergunto o que ele acha do inglês e seu impressionante número de gols no país: "Ele marcou um hat-trick contra o Al-Hilal, mas acho que pode fazer mais. Gostaria que jogasse com mais coração".
Antes que eu consiga fazer outra pergunta, seu amigo Rayan interrompe: "Ele faz gols. Simples. Toney faz o trabalho dele pro nosso time. Eu amo ele".
Deixo os dois discutindo e entro no grandioso Estádio Cidade Esportiva Rei Abdullah. Com sua estrutura de treliça entrelaçada contra o pôr do sol, é o tipo de megaestrutura no deserto que não pareceria fora de lugar em Duna, de Frank Herbert.
Lá dentro, as três arquibancadas em anel comportam pouco menos de 65 mil pessoas. Mesmo faltando quatro horas para o jogo, dá para sentir que vai ser barulhento.
Apesar de ter apenas uma década, o estádio tem uma sensação vivida que faltava em Riad. Tem aquela atmosfera indescritível que só a história oferece. Em resumo: o estádio tem alma.
A hora do jogo se aproxima e, com cada minuto, o ar úmido e sufocante da noite aumenta a tensão e o ruído.
À minha frente, ocupando as três arquibancadas, está a torcida do Ahli. O som dos tambores ritmados pontua os cantos enquanto quatro homens comandam a torcida como maestros.
À minha direita, os torcedores do Ittihad — em menor número por ser um jogo fora de casa — ainda assim criam um zumbido ensurdecedor.
Quando os jogadores entram em campo, o volume atinge níveis impressionantes — mal consigo ouvir meu colega do lado.
As torcidas revelam suas bandeiras. O Ittihad exibe uma faixa gigante com o que parece ser um conquistador espanhol de amarelo e preto. Do outro lado, cada torcedor do Ahli levanta um pedaço de papel formando um dragão com a palavra “Caution” (Cuidado) cobrindo todo o anel inferior. Um repórter local me alerta: as letras “C”, “a” e “t” estão em amarelo — uma provocação ao Ittihad, conhecido como “os Tigres”.
A bola rola e o barulho não diminui. O clima permanece fervente e o árbitro russo, Sergey Ivanov, não consegue controlar algumas das jogadas mais desleais dos dois lados. Há empurrões, simulações e dois pênaltis analisados pelo VAR em dois minutos no fim do primeiro tempo — nenhum é marcado, aumentando ainda mais as vaias.
O placar está zerado no intervalo. No caminho para a sala de imprensa, sou abordado por Amar, um torcedor do Ahli com cerca de 30 anos: "Está gostando do jogo? O jogo está bom!".
Os torcedores estão melhores, eu respondo. "Você acha que temos uma torcida melhor que a da Premier League?", ele me pergunta, sorrindo. "Acho que talvez vocês tenham mesmo", respondo, entrando no elevador, em busca de café e um descanso do zumbido tipo Metallica que ecoa na cabeça.
Com os ouvidos recuperados e café em mãos, volto ao assento para um segundo tempo ainda mais insano.
Roger Ibañez abre o placar para o Ahli com uma cabeçada certeira aos 13 minutos do segundo tempo. Mas, aos 25 minutos, Moussa Diaby empata com um belo chute cruzado.
Com o cansaço aumentando, os espaços aparecem no meio-campo. Nem o incansável N’Golo Kanté consegue cobrir tudo. Um erro incomum dele na área entrega a bola nos pés de Toney, que gira e marca o que parece ser o gol da vitória.
A torcida da casa entra em êxtase e começa a lançar os papéis no gramado, criando um efeito visual que lembra a Argentina de 1978.
O jogo fica parado por quase oito minutos, e o árbitro adiciona 13 de acréscimos — o que irrita ainda mais os anfitriões.
Isso dá tempo para o Ittihad se lançar ao ataque. Aos 50 do segundo tempo, Karim Benzema aparece livre no segundo pau e marca o gol de empate no apagar das luzes.
Com o empate selado e a torcida rouca, consigo falar rapidamente com Toney nos corredores do estádio: "Eles tiveram sorte", dispara, a caminho do ônibus.
Com a noite ainda quente, lembro de algo que os amigos brigões Ali e Rayan me disseram mais cedo:
"Acho que nunca seremos como a liga inglesa, mas por que não maiores que a França ou a Alemanha?", disse Fawad.
"Temos Cristiano, Benzema... já temos os melhores jogadores", afirmou Rayan.
Talvez o calor e o suor estejam me afetando... mas ao sair do estádio e dar adeus a Jedá, está cada vez mais difícil discordar.
📸 Yasser Bakhsh - 2025 Getty Images